Fiquei milionário e perdi tudo

Nome: Carlos
Profissão: Administrador de Empresas

História: Em 1982 a moeda circulante no Brasil era o cruzeiro. Não obstante a economia do país vivesse momentos tumultuados, eu havia construído uma casa em parceria com meu sogro e, mal a termináramos, tínhamos conseguido vendê-la com um bom lucro. A parte que me coube foi de 50 milhões de cruzeiros, equivalentes na época talvez a uns 30 mil dólares, não sei ao certo.

Como o mercado imobiliário estivesse em declínio, meu sogro e eu concluímos que não valia a pena aplicar o dinheiro em construção novamente. Foi então que decidi me aconselhar com o gerente responsável por minha conta bancária. Ele nem titubeou: – compre ações do banco! – disse. E enfatizou – devem ter uma valorização 30% superior à inflação. – Certeza? – perguntei. – É a melhor aplicação do momento – respondeu, transmitindo segurança.

E ele tinha razão.

Comprei, de uma só tacada, 4 milhões de ações PP, a Cr$8.000,00 cada, num total de 32 milhões de cruzeiros. Eu, que nunca me interessara pelo mercado de capitais, de um momento para o outro me tornei um investidor e, com isso, um leitor contumaz das cotações da BOVESPA.

O caderno de finanças do jornal só me dava alegrias. Dia-a-dia minhas ações só faziam engordar. Ao final de três meses as ações chegaram a Cr$18.000,00 e o banco decidiu distribuir bonificações. Quatro ações para cada uma. Concluído o período de bonificação, o valor da ação caiu para os mesmos Cr$8.000,00 que eu havia pago pelas do lote inicial. Só que agora eu tinha 20 milhões delas, quadruplicando meu investimento inicial. Comecei até a pensar em largar todos meus outros negócios – eu tinha 32 anos – para me dedicar ao mercado financeiro. Que maravilha!

A bolsa continuou a subir, as ações atingiram o patamar de Cr$20.000,00 e eu cheguei a pensar em vendê-las. Fui ao banco.

– Não senhor! – me disse o gerente. – Isso é apenas o começo de um ciclo. A ação vai chegar fácil aos Cr$50.000,00.

- Será? – disse eu desconfiado.

– Já te dei algum palpite errado? – retrucou o meu guru, demonstrando impaciência diante da minha pouca fé. E passou a discorrer sobre a pujança da bolsa de valores, a maturidade do mercado e mais uma série interminável de motivos para que eu não vendesse meus papéis. Eu, que nem estava tão seguro assim de que deveria mesmo vender, aceitei seus argumentos e recuei do meu propósito. Fantástico, o meu gerente!

Decorridos pouco mais de dois meses, cada ação já valia Cr$32.000,00. Os meus 32 milhões haviam se transformado em 640 milhões. Descontada a inflação, meu capital inicial àquela altura já havia sido multiplicado por 15. Seis meses antes eu sequer sonharia ser dono de uma fortuna como aquela.

Aí, apareceu um amigo chato – todo mundo tem um amigo chato – e me disse: – venda rápido essas ações e compre dólares, porque em nenhum lugar do mundo você vai conseguir um lucro desses em tão pouco tempo. Sabe como é amigo chato, né? Ele repetiu aquela lenga-lenga no meu ouvido por uns quinze dias seguidos, até que, contrariando o meu guru, que me aconselhara o contrário, decidi vender minhas queridas ações. Mantive as 4 milhões do lote inicial e vendi as restantes. No total, entre ações e dinheiro eu devia ter uns 400 mil dólares.

Como ainda tinha ações, continuei de olho na cotação. Cr$32.500,00, Cr$33.000,00, Cr$33.500,00... Que raiva daquele chato... Quando bateu em Cr$34.000,00 decidi recomprar as 16 milhões que havia vendido.

Pois bem. Foi a última vez em que fui milionário na minha vida! Não me lembro ao certo, mas acho que cada ação chegou a valer Cr$36.000,00. Eu dava risada sozinho e cheguei a fugir do amigo chato para não ter que ouvir as mesmas asneiras. Agourento...

A bolsa teve um pequeno abalo e minhas ações voltaram para Cr$32.000,00. Meio assustado, pois nunca tinha passado por uma situação assim, corri ao meu gerente. – Mas que bobagem – ironizou. – Semana que vem deve subir. Chega aos Cr$60.000,00 até o fim do ano, com certeza! Um investidor experiente deve estar acostumado com essas oscilações. Coisa passageira. Mantenha-se frio!

Mas a ação, a despeito do que ele me garantia sempre que eu ia à agência, foi caindo mês após mês. A inflação correndo solta. Eu, embora confiante na prometida recuperação, já nem queria ganhar mais do que os Cr$32.000,00 por ação que eu conseguira na primeira venda. Prometi a mim mesmo que se ela chegasse naquele valor eu realizaria o lucro.

Esperei em vão!

Passado um ano, desesperançoso e atingido na minha autoconfiança, acabei vendendo aquele monte de ações. Sabem quanto apurei por elas? Os mesmos 32 milhões investidos no início. Sem correção monetária!

Copyright © 2007 Alessandra Bonafé. Todos os direitos reservados